rezar, cantar ou dizer simplesmente:
em Tudo Amar e Servir
Santo Inácio de Loiolaestou comovida com quem me ensina, de longe e de perto, este amar e servir e estou triste pelos que não têm dois minutos para carregar no botão play do respeito.
por hoje é tudo
as casas e as pessoas
Natal, 23 de Setembro de 2005
1ª casaDe tanto ouvir que as casas devem estar assentes em pedra firme e não em areia, dou por mim muitas vezes a tentar arranjar algum cimento para que as areias não fujam com as desilusões, distâncias, confusões, distracções…
A minha casa tem ano e meio de vida. Foram precisos alguns meses para que eu entrasse em casa e admitisse que a minha forma de ser estava espalhada por todas as divisões. Pensava que não era a minha casa dos sonhos porque não foi arrendada em dia de sonhos, mas hoje, sinto um conforto enorme quando entro em casa e tenho quatro olhos pretos a olharem para mim e a dizerem: “vem brincar connosco, anda miúda”. Esta é a minha casa que já sabe contar a história de um sofá verde, de um bolo de chocolate no forno, de uma tese no escritório e de uns vasos de flores nas escadas.
2ª casaOntem fui ver mais uma casa. Paredes amarelas, azuis, vermelhas e brancas. Uma casa e três meninos lindos, cada um com a sua história, não menos longe da minha vida. Ainda a casa vai a meio das paredes e já apetece entrar nela, ficar e sorrir. Quero muito bem aos meninos daquela casa e eu prometo o cheiro de um bolo de chocolate quando o cimento estiver seco.
3ª casaPassei por uma favela em Natal. Não avancei muito mais que a beira da estrada porque diziam que era uma zona perigosa. Não consegui ver perigo nos olhos pacatos de quem cimenta quatro tijolos por dia e de quem tem o mar mesmo no horizonte. Fez-me impressão a pequenez da casa destas pessoas, mas também ali não faltava o cimento.
De hoje em diante quero ter uma casa como o tal sorriso de Eugénio de Andrade. Quero entrar nela, sentir-me dentro dela e viver muito protegida pelas paredes que me envolvem. é difícil, mas não custa tentar.
cântico negro
pelas ruas de Natal, 22 de Setembro 2005
Quem esteve comigo estes dias sabe o quanto me apaixonei por esta figura urbana que deambulava pela marginal de Natal desde as 5 horas da manhã até ao anoitecer. com mais de 10 vassouras, cada uma com o seu estilo próprio, com mais de 10 sacos de plásticos com cores diferentes, com um carroça de madeira velha e não menos velha que um rosto negro que não devia ter mais do que 30 anos. deambulava e trazia um chapéu laranja feito de linha, umas calças leves azuis gastas e umas galochas a romperem as calças. procurava em todos os caixotes do lixo a sobrevivência e talvez não fosse o único que o fizesse. em Natal eram muitos os que procuravam no lixo a vida.
não consigo deixar de pensar nos passos que este homem foi dando ao longos dos dias e fico com o corpo inteiramente estranho quando penso que fará este mesmo trajecto ao longo de toda a vida.
mesmo assim, olhou para a máquina fotográfica e sorriu. penso que todos os dias me sorria porque sabia que andei a vigiá-lo. não sei se por vergonha, se por egoísmo de quem tem uns sapatos de pele para calçar todos os dias, não fui falar com ele.
não quero ter o mesmo trajecto para toda a minha vida, nem mesmo procurar no lixo a vida, embora consiga perceber que o sustento e a felicidade deste homem possa passar por aí. apetece-me dizer em voz alta o mesmo cântico que José Régio escreveu e enviar para a minha própria caixa do correio as suas últimas palavras:
Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!
Ninguém me peça definições!
Ninguém me diga: "vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou.
É uma onda que se alevantou.
É um átomo a mais que se animou...
Não sei por onde vou,
Não sei para onde vou,
Sei que não vou por aí.
no final de contas... se ontem tivesse coragem tinha ido por ali... e os meus pés sentiriam a mesma terra que tu e os meus olhos olhariam o mesmo céu que tu. o convite ficou no ar e o meu coração também. Benguela já é o nosso lugar.
estás por perto, eu sei
hoje recebi um beijo de longe... de muito longe ... de longe e longe. do outro lado do mundo, pelo mar, com cheiro a áfrica, pelas cores vivas e com vida. veio sem um porquê, mas veio. trouxe com ele um olhos marcantes e sem nada escrito no preto.
só queria uma coisa pequenininha: ter-te por perto para te dizer que hoje o meu dia está azul.... como um dia tu me disseste ao ouvido. dizer-te também que o vaso das margaridas continua no parapeito da nossa casinha e que agora estão viradas ao sol e parecem brilhar.
era só isto que te queria dizer... mais nada...
se quiseres volta amanhã e entra pela noite escura.... e encontras-me com o teu livro de poemas na minha mão.
estou feliz!
livre, liberdade, verdade
Natal, 22 de Setembro de 2005
hoje sinto-me cansada de tantas opções de liberdade.
já percebi porque é que tantos seres humanos tomam decisões depois de ausentes do seu espaço de acolhimento e do seu espaço vivido. dizem que a vida se torna mais clara e que os desejos e futuros se tornam mais transparentes de tão óbvios.
ontem à noite soltei as amarras de um passado recente e hoje soltei ainda mais as amarras para um futuro.
não que tenham mudado os tempos nem as vontades ... apenas a certeza que o meu coração e os meus braços estão livres para qualquer coisa de maior.
mesmo assim, nunca ninguém me disse ao ouvido que o dia da liberdade podia ser de lágrimas. elas correm no meu rosto porque me custou soltar as amarras mas quando olho em frente elas dão lugar ao tal genuíno sorriso de uma margarida inteiramente livre para o que der e vier.
ou não fosse verdade que quando se diz um "não" se recebe um "sim" logo de seguida.
em frente, em frente capitão!
quando as palavras nos faltam para agradecer
Por enquanto não consigo continuar a escrever o diário de Natal.
As palavras não saem desta pequena garganta, já presa com um nó.
As ideias ainda estão meias confusas e sem capacidade para se soltarem uma a uma.
Quero agradecer mas não consigo. Quero dar mais e ainda nem forças tenho. estou a levitar.
Chego ao meu gabinete.... a 7 horas de Natal e com os olhos brilhantes dedico esta música a todos os que a ouviram com um sorriso no rosto e principalmente a quem a sentiu com os olhos.
bem haja a todos aos professores (Fernanda, Norberto, João, Paulo, Ana e Zé).... prometo continuara a fazer power points e a cantar esta música para vocês.
Aquarela
Toquino e Vinicius
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
E com cinco ou seis retas é fácil fazer um castelo
Corro o lápis em torno da mão e me dou uma luva
E se faço chover com dois riscos tenho um guarda-chuva
Se um pinguinho de tinta cai num pedacinho azul do papel
Num instante imagino uma linda gaivota a voar no céu
Vai voando contornando
A imensa curva norte sul
Vou com ela viajando
Havaí, Pequim ou Istambul
Pinto um barco a vela branco navegando
É tanto céu e mar num beijo azul
Entre as nuvens vem surgindo
Um lindo avião rosa e grená
Tudo em volta colorindo
Com suas luzes a piscar
Basta imaginar e ele está partindo
Sereno indo
E se a gente quiser
Ele vai pousar
Numa folha qualquer eu desenho um navio de partida
Com alguns bons amigos, bebendo de bem com a vida
De uma América a outra consigo passar num segundo
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo
Um menino caminha e caminhando chega num muro
E ali logo em frente a esperar pela gente o futuro está
E o futuro é uma astronave
Que tentamos pilotar
Não tem tempo nem piedade
Nem tem hora de chegar
Sem pedir licença muda nossa vida
E depois convida a rir ou chorar
Nessa estrada não nos cabe
Conhecer ou ver o que virá
O fim dela ninguém sabe
Bem ao certo onde vai dar
Vamos todos numa linda passarela
De uma aquarela que um dia enfim
Descolorirá
Numa folha qualquer eu desenho um sol amarelo
Que descolorirá
E se faço chover com dois riscos tenho um guarda-chuva
Que descolorirá
Giro um simples compasso e num círculo eu faço o mundo
Que descolorirá
Natal, 21 de Setembro de 2005
Miguel escreveu um diário com entrelinhas entre o Brasil, Trás-os-Montes e Coimbra, com uma casa velhinha e uma vida de estudante, com uma árvore que se chamava também Torga. No diário deixou passar uma luta por qualquer coisa maior, por qualquer coisa possível em que acreditava.
Gostava também eu de reescrever o diário do Miguel e de dizer o que aconteceu no dia 21 de Setembro de 2005.
Uma manhã inquieta, frases que não conseguia decorar, professores a darem apoio e acreditarem que sou mais do que um miúda inquieta com os seus 27 anos. Senti-me levada ao colo para algum lugar ou para algum não-lugar. Não importa: estive, reestive, reencontrei.
De fuga a um auditório procurei a praia, a areia, os cocos espalhados entre as pessoas, o calçadão grande e cheio de calor.
Estava na hora de enfrentar as ondas… há quantos anos, margarida, há quantos anos não voltava à tona de água, nadava sem ter um fim, sentia o sal nas palavras e subia à tona com um sorriso genuíno. Sou eu….
Estava na hora de deixar de lado um anel que me chegou com um ano de atraso, mas que nem por isso teve menos significado. Um compromisso mais de amor do que amizade mas que a distância obrigou-me a mergulhar novamente nas ondas da tarde. Logo acordei…
Estava na hora de dar a mim mais do que 24 horas de “outros”. Sem barreiras o encontro é fácil, é obvio e translúcido. Aqui estou…
Foi um dia de conquistas e reconquistas sem espadas nem espingardas para dar conta do recado. Estava rodeada de vidas mais bonitas e claramente o meu caminho seria seguir quem me queria dar sabedoria. Percebi o que quero.
Estava na hora de dizer ao senhor sininho que a vida é curta demais para se pensar em reviravoltas de vidas cruzadas. Não insisto mais do que dois dias e esses dias já passaram. Agora é a tua vez. Eu não estou à espera.
Estava na hora de perceber que em cada natal pode eventualmente nascer algo de novo. Não peço para mim mais caminho, mais tempo para o percorrer. O está e nada mais. Agora, de coração leve, de costas direitas, de olhos abertos pelo mar seguirei um mais firmeza os meus princípios. Quem alinha numa vida mais séria e nunca menos sonhadora?
mais uma partida
não nasceu ninguém, não estamos em dezembro, não me casei.
dizem que no Natal deve haver um espacinho de nós para parar, para rezar, para agradecer, para enviar mensagens de boas festas.
dizem também que Natal é um dos não-lugares mais concorridos pelos que querem celebrar o início de uma vida a dois...
Enfim, Natal cheira-me a sol.... muito sol para aquecer a vida... que nos últimos dias anda mais fria que cubos de gelo. cheira-me a uma viagem que foi planeada para ser assim, sem pensar que o lugar 56 do avião deveria estar ocupado. cheira-me a liberdade e uma vontade incrível de dançar. cheira-me que quero sair de mim.
mais um vez estou de férias ..... regresso depois do Natal
portugal dos pequenitos
Portugal dos Pequenitos, 15 de Setembro de 2005 Sebastião da Gama diz-me para abrir as janelas e voar, António Gedeão diz-me que o sonho comanda a vida, e por ai fora.... ando a ler poemas que me encaminhem para uma solução mais bonita, no entanto, o sonho nem sempre me tem levado a essa leveza de missão cumprida. peço e volto a pedir coisas muito pequeninas mas que por serem tão desejadas nunca foram tão grandes como agora. Agora, andam os meus passos à volta de uma saudade e de uma vontade de reconquistar o que já tive.
nada disto é novo, mas confesso que à minha volta, as pessoas de quem mais gosto andam igualmente com as janelas fechadas, sem luz, com cartas baralhadas, com amores perdidos, com futuros muito incertos, com tempos perdidos (há qem me diga que "anda a perder tempo" ).
raios_partam os relógios biológicos e as fitas adesivas que nos calam e que não deixam o coração crescer.
ontem fui ao Portugal dos Pequenitos... ao final da tarde... sozinha e com o objectivo de fotografar crianças a brincarem com o mundo... mas ò senhor Gedeão será que o mundo pode pular e avançar mesmo que já não sejamos crianças? como é que se pode brincar neste mundo?
esclarecimentos
SR, Igreja de Santa Cruz, 14 de Setembro de 2005
coisas pequenas são o que eu te quero dar e coisas pequenas são também as que me fazem feliz. ontem foi dia de almoçar com dois amigos e à sobremesa deambulámos pelas ruas da baixa e, de objectivas ao alto, captamos os lugares.
ainda ando a descobrir o que é este diálogo entre lugar e não-lugar.
deixo aqui duas possíveis explicações para que possam acreditar um pouco mais nesta minha utopia.
para os senhores da geografia humanista (surgiu nos anos 70 e como reacção ao positivismo) como Edward Relph e Yi-Fu Tuan... o LUGAR é mais do que uma localização geográfica. o lugar é um produto da experiência humana e da relação existente. o lugar é o resultado da relação afectiva e emotiva que as pessoas estabelecem com os espaços. existe um cenário físico, existe uma actividade , existe uma relação íntima entre o lugar e o ser humano que o anima. no lugar há uma história, há uma relação afectiva e há uma identificação entre o lugar e o ser humano.
Agora o NÃO-LUGAR.. não significa a negação de um espaço físico nem a perda de identidade com os lugares. significa que com a alteração da paisagem urbana vão surgindo espaços com formas estandardizadas, repetidas e com uniformidade de sequência - i.e. grandes conjuntos habitacionais (gosto mais dos da periferia), McDonnald's, Disneylândias (Portugal dos Pequenitos), bancos, estações de m etro (Estação Coimbra B), parques de estacionamento, auto-estradas (Circular Externa), centros comerciais (Dolce Vita)etc... . Não-Lugares de passagem, frequentados por anónimos, não têm uma história, nem se estabelece um elo afectivo com estes lugares (mas acredito que nalguns casos isto não seja bem assim!)
daqui a 3 dias vou tentar mostar aos senhores do mundo da geografia que em Coimbra os Lugares e os Não-Lugares estão espalhados pela cidade e que vão nascendo como cogumelos....mais do que mostrar a sua existência é necessário dizer que ser um lugar ou um não-lugar depende muito do nosso espaço vivido e da forma como vivemos esta cidade. um não é a negação do outro mas muitas vezes os lugares por estarem fora do nosso quotidiano passam a ser não-lugares.... e por ai adiante....
"sedoxil" ainda não cura tudo
ainda faltam alguns meses, ou ainda faltam muito meses.
quero ir à caixa do correio e ter uma carta sonhadora. quero tirar a fita vermelha de um embrulho pequenino. quero ficar uma noite ansiosa por ir receber um presente que a amanhã me irá trazer. quero receber duas mãos para caminhar e dois pés para andar no ar. quero receber dois olhos grandes. quero escrever a quatro mãos uma música.
quero tantas e tantas coisas e nunca estive tão ansiosa por não as ter. confesso-me impaciente pelo futuro. decubro que sou exigente no presente.
voltei à praia
Mesmo que não conheças nem o mês nem o lugarcaminha para o mar pelo verãoRuy Belo
Foi isto que repetiste aos meus ouvidos: caminhar, caminhar, caminhar, arriscar, cair, caminhar, voltar e perder. quando tenho medo do futuro faço com que o mar venha até mim. quando sei que estás longe o mar vem ter comigo. e foi isto que fiz em menos de 48 horas.
praia da gala, figueira da foz, 11 de setembro
(des)férias
férias que não foram férias. férias que não leram o significado de férias no dicionário.
partilhei trabalho e desvaneci-me em utopias.
o peter pan transformou-se em sininho e fez-me sorrir.
troquei as voltas ao sono, aos dias e às noites.
quando conseguia acordar ora comia flocos de mel ora ouvia poesias estranhamente bonitas.
ultrapassei refeições porque ao longo do dia já tinha comido muitas palavras, muitas imagens e muitos olhares.
a minha viola começou a tocar jorge palma e... alguém com uma cara sardenta encheu-me o olhar.
a 45km e em 20minutos sentei-me numa rocha e vi o mar.
as minhas férias começaram ontem de noite quando alguém, que tinha uma mala de viagem na mão, me deu um beijo como este.
hoje estou de férias e fechada para balanço.
estou
assumidamente à deriva, insegura, estranha, confusa, presa. ninguém avisou que era fácil.
menino-do-mar
Confiança
O que é bonito neste mundo, e anima,
É ver que na vindima
De cada sonho
Fica a cepa a sonhar outra aventura...
E que a doçura
Que se não prova
Se transfigura
Numa doçura
Muito mais pura
E muito mais nova...
Miguel Torga
as férias foram interrompidas porque ainda não foram férias. porque amanhã vai ser o dia em que o miguel torga será geógrafo e em que o geógrafo será miguel torga. boa sorte ao menino-do-mar